Por que, apesar de estar cercado de tanto misticismo, o conceito de reencarnação e a multiplicação de relatos e lembranças de outras vidas atraem tanto a ciência?
Na Universidade de Virgínia, uma das mais prestigiosas dos Estados Unidos, pesquisadores da área de saúde
mental dedicam-se há décadas a desafiar os céticos. Ali são estudados,
entre outros casos ,
relatos sobre reencarnação.
Tais relatos são sempre intrigantes, mesmo sem apresentar relatos conclusivos em relação ao que a ciência já alcançou em termos de compreensão deste fenômeno. O pesquisador Ian Stevenson está à
frente da Divisão de Estudos da Personalidade. Ele é um dos mais famosos pesquisadores do tema. Suas publicações científicas descrevem casos de crianças que se
recordariam de suas existências passadas e também relata casos de pessoas com marcas de nascença, originadas devido a cicatrizes feitas em existências anteriores.
Os casos são avaliados da maneira mais científica possível: são realizadas entrevistas, confrontam a versão narrada
com documentações, comparam descrições com fatos que só familiares da
pessoa morta poderiam saber. Graças a sua dedicação e esforço, ele se tornou um dos maiores
responsáveis por ajudar colocar o
conceito de reencarnação também no campo da ciência, já que tais conceitos já existem em diversar religiões, cercados por fé, dogmas e muito misticismo.
Mas o que leva esse médico com mais de 60 anos de carreira, junto com tantos pesquisadores a se dedicar tanto a encarar a reencarnação
como uma hipótese válida cientificamente?
São histórias como a
de uma menina nascida em 1948, Swarnlata Mishra, de uma rica família da
Índia. Ela se tornou protagonista de um dos casos mais conhecidos da literatura médica sobre vidas passadas. A história é descrita
em um dos livros de Ian Stevenson, Twenty Cases Suggestive of Reincarnation
(“Reencarnação - Vinte Casos”), e se
assemelha a outros tantos casos registrados pelo mundo sobre lembranças reveladoras
ocorridas, principalmente, na infância. Mas, ao contrário da maioria,
não está relacionado a mortes violentas, confrontos ou traumas.
A
história de Swarnlata é simples. Aos 3 anos de idade, viajava com seu
pai quando, de repente, apontou uma estrada que levava à cidade de Katni
e pediu ao motorista que seguisse por ela até onde estava o que chamou
de “minha casa”. Lá, disse, poderiam tomar uma xícara de chá. Katni está
localizada a mais de 160 quilômetros da cidade da menina, Pradesh. Logo
em seguida, Swarnlata começou a descrever uma série de detalhes sobre
sua suposta vida em Katni. Disse que lá seu nome fora Biya Pathak e que
tivera dois filhos. Deu detalhes da casa e a localizou no distrito de
Zhurkutia. O pai da menina passou a anotar as “memórias” da filha.
Recordações de mãe
Sete
anos depois, em 1959, ao ouvir esses relatos, um pesquisador de
fenômenos paranormais, o indiano Sri H. N. Banerjee, visitou Katni.
Pegou as anotações do pai de Swarnlata e as usou como guia para
entrevistar a família Pathak. Tudo o que a menina havia falado sobre
Biya (morta em 1939) batia. Até então, nenhuma das duas famílias havia
ouvido falar uma da outra.
Naquele mesmo ano, o viúvo de Biya, um
de seus filhos e seu irmão mais velho viajaram para a cidade de
Chhatarpur, onde Swarnlata morava. Chegaram sem avisar. E, sem revelar
suas identidades ou intenções aos moradores da cidade, pediram que nove
deles os acompanhassem à casa dos Mishra. Stevenson relata que,
imediatamente, a menina reconheceu e pronunciou os nomes dos três
visitantes. Ao “irmão”, chamou pelo apelido.
Semanas depois, seu
pai a levou para Katni para a casa onde ela dizia ter vivido e morrido.
Swarnlata, conta Stevenson, tratou pelo nome cada um dos presentes,
parentes e amigos da família. Lembrou-se de episódios domésticos e
tratou os filhos de Biya (então na faixa dos 30 anos) com a intimidade
de mãe. Swarnlata tinha apenas 11 anos.
As duas famílias se
aproximaram e passaram a trocar visitas – aceitando o caso como
reencarnação. O próprio Stevenson testemunhou um desses encontros, em
1961. Ao contrário de muitos casos de memórias relatadas como de vidas
passadas, as da menina continuaram acompanhando-a na fase adulta –
quando Swarnlata já estava casada e formada em Botânica.
Assim
como esse, há milhares de outros episódios intrigantes, alguns mais e
outros menos verificáveis. Somente na Universidade da Virgínia há
registros de mais de 2500 casos desse gênero. Acontece que, para a
ciência, a ocorrência de casos isolados, ainda que numerosos, não prova
nada. Os céticos atribuem essas histórias a fraudes, coincidências ou
auto-induções às vezes bem intencionadas.
Mas, embora a ciência
duvide da reencarnação, a humanidade convive com a crença nela faz
tempo. De acordo com algumas versões, o conceito de reencarnação chegou
ao Ocidente pelas mãos do matemático grego Pitágoras. Durante uma viagem
que fizera ao Egito, ele teria ouvido diversas histórias e assistido a
cerimônias em que espíritos afirmavam que vinham mais de uma vez à
Terra, em corpos humanos ou de animais. O mesmo conceito – com variações
aqui e ali – marcou religiões orientais, como o bramanismo e o
hinduísmo (e, mais tarde, o budismo), e também religiões africanas e de
povos indígenas, segundo Fernando Altmeier, professor de Teologia da PUC
de São Paulo. Na verdade, “a reencarnação nasce quase ao mesmo tempo
que a idéia religiosa tanto no Ocidente quanto no Oriente, com os
egípcios, os gregos, os africanos e os indígenas”, diz Altmeier. A
idéia, porém, não deixou traços – pelo menos não com a mesma força – nas
três religiões surgidas de Abraão: o judaísmo, o cristianismo e o
islamismo.
No século 19, o francês Hippolyte Leon Denizard Rivail –
ou Allan Kardec – e outros estudiosos dedicaram-se a um tema então em
voga na Europa: os fenômenos das mesas giratórias, em que os sensitivos
alegavam que espíritos se manifestavam com o mundo dos vivos. Kardec
escreveu uma série de livros sobre as experiências mediúnicas que
observou e, tendo como base a idéia da reencarnação, fundou a doutrina
espírita. Para os espíritas, reencarnação é um ponto pacífico. Mas
muitos deles preferem dar crédito a relatos embasados no cientificismo.
“Dirijo a área de assistência espiritual na Federação Espírita do Estado
de São Paulo, por onde passam 200 mil pessoas por mês, mas, no que diz
respeito à fenomenologia, sou mais pé no chão, sou muito rigoroso”,
afirma o advogado Wlademir Lisso, de 58 anos.
Terapias e evidências
Nas
aulas que dá na federação sobre espiritismo e ciência, Lisso – que é
autor de três livros – se baseia, sobretudo, nas pesquisas feitas por
universidades estrangeiras, que considera mais confiáveis. Lisso diz que
já perdeu as contas das vezes que ouviu pessoas lhe dizendo que tinham
lembranças de outras vidas, algumas, talvez, por meio das chamadas
terapias de vidas passadas. “Terapias, por si só, não provam nada”, diz
Lisso, referindo-se a uma prática que supostamente leva a pessoa a
escarafunchar memórias tão remotas quanto as de duas, três encarnações
anteriores. Os espíritas não recomendam a experiência. “Até os anos 50,
flashes ou outras manifestações eram considerados distúrbios mentais”,
diz Lisso. Com o tempo, ganhou eco a explicação de que muitos desses
sintomas poderiam ser evidências de existências passadas.
No
Brasil, um dos poucos que seguiram a linha da investigação mais
científica foi Hernani Guimarães Andrade, que morreu há quase dois anos.
Autor de diversos livros, entre eles Reencarnações no Brasil (O Clarim,
sem data), Andrade conta o caso de uma menina paulistana, identificada
apenas como Simone. Nos anos 60, quando tinha então pouco mais de 1 ano,
ela começou a pronunciar palavras em italiano, sem que ninguém a
tivesse ensinado. Passou também a relatar lembranças que remontavam à
Segunda Guerra Mundial. Seu relato era tão vívido que familiares se
renderam à idéia de que fragmentos de uma encarnação passada ainda
pairavam em sua mente. A avó da menina registrou, em um diário, mais de
30 palavras em italiano pronunciadas pela neta e histórias de explosões,
médicos, ferimentos e morte. As recordações pararam de jorrar quando a
menina tinha por volta de 3 anos.
Mas as supostas memórias de
crianças como Simone e Swarnlata não são os únicos sinais que chamam a
atenção dos estudiosos. Em várias universidades ao redor do mundo, os
pesquisadores passaram a examinar também marcas de nascença – associadas
a lembranças – como possíveis evidências de reencarnação. O mesmo
Stevenson reuniu um punhado desses casos num estudo divulgado em 1992.
Segundo o levantamento feito com 210 crianças que alegavam ter
lembranças de outras vidas, cerca de 35% apresentavam marcas de
nascimento na pele. Em 49 casos, foi possível obter um documento médico,
geralmente um laudo de necropsia, das pessoas que as crianças haviam
supostamente sido em outra encarnação. A correspondência entre o
ferimento que causara a morte e a marca de nascença foi considerada, no
mínimo, satisfatória em 43 casos (88%), segundo Stevenson.
Um
exemplo citado por ele é o de uma criança da antiga Birmânia que dizia
se lembrar da vida de uma tia que morrera durante uma cirurgia para
corrigir um problema cardíaco congênito. Essa menina tinha uma longa
linha vertical hipopigmentada no alto do abdome. A marca correspondia à
incisão cirúrgica da tia. Stevenson recorre a uma frase do escritor
francês Stendhal para se referir a casos de memórias e de marcas que, às
vezes, podem passar despercebidos: “Originalidade e verdade são
encontradas somente nos detalhes”.
Tinta fresca
Para pesquisador, há fortes indícios de que muitas crianças conseguem se lembrar de suas vidas anteriores
O
professor Jim B. Tucker, da Divisão de Estudos da Personalidade do
Departamento de Psiquiatria da Universidade da Virgínia, nos Estados
Unidos, estuda e atende casos de depressão e outros distúrbios em
crianças e adolescentes. Tem especial interesse por casos de crianças
que alegam ter lembranças de vidas passadas. Nesta entrevista, concedida
por e-mail à Revista Superinteressante, Tucker fala das características mais freqüentes
desses relatos e de fatos que mais o impressionaram.
Quantos casos de crianças que alegam lembrar de vidas passadas o senhor já observou?
Temos mais de 2 500 casos registrados em nossos arquivos. Eu, pessoalmente, vi vários.
Quais são as principais características desses casos?
Os
casos geralmente envolvem crianças pequenas que dizem se lembrar de uma
vida passada. Elas podem descrever a vida de um membro falecido da
família ou um amigo da família ou podem descrever a vida de um estranho
num outro local. Outros fatos incluem marcas de nascença que combinam
com os ferimentos no corpo da pessoa falecida e comportamentos que
parecem ligados à vida anterior.
Há uma explicação para o fato de as lembranças ocorrerem principalmente durante a infância?
As
crianças começam a fazer seus relatos numa idade precoce, logo que
começam a falar. Isso faz sentido, porque parecem ser memórias que elas
carregam consigo desde a vida anterior.
Quais tipos de evidências mais impressionaram o senhor?
Ainda
acho que a mais forte evidência envolve declarações documentadas que
alguma criança tenha feito e que se provaram verdadeiras em relação a
uma pessoa que viveu a uma distância significativa. O dr. Jünger Keil
(pesquisador da Universidade de Tasmânia, na Austrália) investigou um
caso na Turquia no qual um garoto deu muitos detalhes sobre um homem que
tinha vivido a 850 quilômetros e morrido 50 anos antes de o menino ter
nascido.
Como médico, o senhor considera possível explicar esses relatos de uma perspectiva científica?
Nenhum
desses casos é “prova” da reencarnação, e um cético pode sempre
encontrar um ponto fraco em um caso ou, como objetivo de desacreditá-lo,
em qualquer estudo médico. Entretanto, como um todo, os casos mais
significativos constituem um forte argumento de que algumas crianças
parecem, sim, possuir memórias de vidas anteriores.
Fonte: http://super.abril.com.br/cotidiano/reencarnacao-memorias-outras-vidas-445651.shtml
https://www.facebook.com/espiritualidaderecife
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